segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

OSHO, O QUE É A ANGÚSTIA?

Osho, o que é angustia? É apenas um outro nome para a ansiedade? A angústia tem algo da ansiedade, mas ela não é apenas ansiedade. É muito mais, muito mais profunda. Ansiedade quer dizer que você está preocupado com um determinado assunto, num estado de indecisão. Você não sabe se deve ou não fazer certa coisa, qual será a forma certa de fazê-la, o que escolher... - há tantas formas. Você está sempre numa encruzilhada. Todos as formas parecem similares; certamente, levando a algum lugar. Mas será que levam à meta que você está aspirando? A ansiedade é essa condição de fazer ou não fazer, de escolher isto ou escolher aquilo. Mas o objeto da ansiedade é claro: você está indeciso sobre as formas de fazer, indeciso sobre duas pessoas, indeciso sobre dois empregos. A angústia não tem nenhum objeto determinado. A angústia é sentida por pessoas muito raras. A ansiedade é sentida por todos: tratase de uma experiência comum. A angústia é sentida somente pelos gênios, pelos mais altos picos de inteligência. Ela não tem nenhum objeto determinado: não há nada para você escolher entre duas alternativas, nenhum "isto ou aquilo". Não existe nenhuma questão de escolha. Então, qual é o problema com a angústia? Vou tentar explicar. É um pouco difícil de compreender, mas não impossível. Nasce uma rocha, nasce uma árvore, nasce um leão, nasce uma águia... - mas estes diferem do homem. A diferença é esta: neles, o ser precede a existência. Por exemplo, uma pedra. Ela é viva, ela cresce. Os Himalaias ainda estão crescendo - trinta e poucos centímetros a cada ano. Alguém pode dizer a ele: "Ora, isso não tem sentido, você já é o mais alto. Não se dê tanto trabalho!". Deve ser algo perturbador: milhares de quilômetros, milhares de picos, o trabalho deve ser enorme. Até mesmo crescer trinta e poucos centímetros a cada ano, não é nenhuma coisinha para os Himalaias. "E agora não há mais necessidade. Por maior que você se torne, você somente permanecerá a montanha mais alta do mundo. Você já ultrapassou todas as montanhas, deixou-as muito lá atrás.". Mas os Himalaias continuam crescendo, ele é um ser vivo. As montanhas não compreendem. O homem não compreende... - o que dizer das montanhas?! Uma rocha, uma árvore, um leão, uma águia... - a essência deles precede a existência. O que eles vão ser, eles já estão programados para ser. Aquela é a essência deles. Uma rosa vai ser uma rosa. Mesmo antes das flores surgirem, você sabe que aquelas flores não vão ser cravos-de-defunto. A árvore é de rosas; a essência da rosa já está ali - simplesmente a existência tem que acontecer. O programa básico já é provido pela natureza, tem apenas de ser manifesto. Será bom lembrarmos aqui de uma certa descoberta em décadas passadas, que aconteceu na União Soviética. Um simples fotógrafo amador, mas um verdadeiro gênio criativo - usando suas câmeras, seus estúdios, a química e a fotografia - estava tentando descobrir diferentes modos de trazer algo novo para a fotografia. E, por acaso, ele fez uma das maiores descobertas da história humana: a fotografia Kirlian. Ele pode tirar uma foto de um botão de rosa. Ele refinou seus instrumentos de tal modo, que a pessoa põe o botão de rosa em frente de sua câmera, e ele tira a foto da flor que o botão vai se tornar. Ele capta a essência que ainda não está manifesta, mas que, de algum modo, está manifesta, porque a câmera a capta. Nossos olhos não são capazes de captá-la. E quando a rosa floresce é estranho, mas ela é exatamente igual a que a foto mostrou. De algum modo, a energia da rosa que mais tarde se torna visível para nossos olhos, estava se movendo no mesmo padrão em que flor iria se tornar. Era uma flor de energia, apenas puros raios de luz e cor, mas exatamente na mesma forma, preparando a base para a manifestação. A câmara capta esses raios e lhe dá uma cópia da futura rosa. Talvez, amanhã ou depois de amanhã, ela se torne disponível a seus olhos. Isso quer dizer que a rosa, antes de se tornar existente, já existe em essência. Desse modo, a afirmação: a essência precede a existência. No homem, a existência precede a essência. Primeiramente, ele nasce e depois, ele começa a descobrir o que ele pode ser. Essa é a angustia. Ele não tem nenhum programa, nenhuma diretriz determinada, dada pela natureza, nenhum mapa a seguir. Ele é deixado apenas como pura existência. Ele tem de descobrir tudo sobre si mesmo. A vida é um desafio a cada momento; assim, a todo momento ele tem de escolher. Sempre que ele tem de escolher, há ansiedade - mas a ansiedade é particular. A angústia é uma estado geral do ser humano. Ele está em angústia desde o nascimento até a morte, porque ele não tem meio de saber qual é o seu destino, onde ele irá parar. É claro, muito poucas pessoas sentem angústia, porque muito poucas pessoas são assim tão cônscias de si mesmas, de suas existências, de para onde estão indo, do que estão se tornando, do que vai acontecer. Elas vivem muito interessadas no trivial. O trivial cria ansiedade. E sempre que há escolha, há ansiedade. Assim, todo mundo, a cada passo, a cada momento de sua vida, encara a ansiedade. A ansiedade é comum, um acontecimento diário. A angústia é muito profunda. As duas palavras vêm da mesma raiz; daí, a questão. Na angústia, há alguma ansiedade, porque você está preocupado, interessado. Mas o interesse não é relativo a qualquer trabalho, a qualquer coisa, a qualquer coisa em particular - não, é uma vaga sensação geral de: "O que sou eu?". Um dos maiores visionários indianos desta era, Raman Mahrishi, tinha somente uma mensagem para todo mundo. Ele era um homem simples, não era um erudito. Ele saiu de casa quando tinha dezessete anos de idade - não tinha muita instrução. Era uma mensagem simples. A quem quer que chegasse até ele - e as pessoas vinham de todas as partes do mundo - tudo o que ele dizia era: "Sente-se num canto, em qualquer lugar...". Ele morava numa colina, Arunachal, e ele tinha determinado a seus discípulos que fizessem cavernas na colina. Havia muitas cavernas. "Vá e sente-se numa caverna, e apenas medite nisto: ‘Quem sou eu?'. Tudo o mais são apenas explicações, experiências, esforços para traduzir essas experiências em linguagem. A única coisa verdadeira é esta questão: Quem sou eu?". Eu entrei em contato com muitas pessoas, mas jamais entrei em contato com Raman Maharishi - ele morreu quando eu era muito novo. Eu não pude ver Raman, mas encontrei muitas pessoas que tinham sido discípulos dele, mais tarde, quando eu estava viajando. Quando fui até Arunachal, eu me encontrei com seus discípulos mais íntimos, que já estavam muito velhos então. E não encontrei nem um único que tivesse compreendido a mensagem daquele homem. Não era uma questão da língua, porque eles todos sabiam o Tamil: era uma questão de uma perspectiva e de uma compreensão totalmente diferentes. Raman tinha dito: "Olhe para dentro e descubra quem é você.". E o que faziam aquelas pessoas quando eu fui lá? Elas transformaram aquilo numa cantilena! Elas se sentavam e entoavam: "Quem sou eu? Quem sou eu? Quem sou eu?" - exatamente como qualquer outro mantra. Há pessoas que estão fazendo seus Japas : "Rama, Rama, Rama", ou "Hari Krishna, Hari Krishna, Hari Krishna"... Em Arunachal, eles estavam usando essa mesma tecnologia para uma coisa totalmente diferente, que Raman jamais teria pensado. E eu disse aos discípulos dele: "O que vocês estão fazendo não é o que ele pretendia. Repetindo 'Quem sou eu?', vocês acham que alguém vai responder? Vocês continuarão a repetir isso por toda a vida e nenhuma resposta virá.". Eles disseram: "Por um lado estamos fazendo o que compreendemos que ele pretendia. Por outro lado, não podemos dizer que você está errado, porque passamos a nossa vida toda cantando quem sou eu, quem sou eu, quem sou eu?..." - claro que em Tamil, na língua deles - "mas nada aconteceu.". Eu disse: "Vocês podem continuar cantando isso durante muitas vidas mais - nada vai acontecer. Não é uma questão de cantar 'quem sou eu?'. Vocês não têm de pronunciar nem uma única palavra, têm simplesmente de ficar silenciosos e ouvir. No começo, vocês descobrirão, como moscas voando ao seu redor, milhares de pensamentos, desejos, sonhos - sem nenhuma relação, irrelevantes, insignificantes. Vocês estão no meio da multidão, num zumbido. Simplesmente fiquem quietos e sentem-se nesse bazar que é a sua mente.". 'Bazar' é uma linda palavra. O inglês tomou-a emprestado do Oriente, mas talvez eles não saibam que ela vem de 'zumbir': um bazar é um lugar que está continuamente fazendo barulho. E sua mente é o maior bazar que existe. Na mente de cada um, num crânio tão pequeno, cada um de vocês está carregando um enorme bazar. E vocês ficarão surpresos de saber que muitas pessoas residem dentro de você - tantas idéias, tantos pensamentos, tantos desejos, tantos sonhos! Vá observando e sente-se silenciosamente no meio do bazar. Se você começar a dizer "quem sou eu?", você se torna parte do bazar - você começou a zumbir. Não seja um zumbidor: simplesmente fique em silêncio. Deixe continuar aquele bazar todo: você permanece o centro do ciclone. Sim, é preciso ter um pouco de paciência. Não é previsível a que horas vai parar o burburinho dentro de você. Mas uma coisa pode ser dita com certeza: ele vai parar numa hora ou noutra. Depende de você, quanto de bazar você tem, por quantos anos você o tem carregado, por quantas vidas você o carregou, quanto nutrimento você lhe deu, e quanto de paciência você tem para se sentar silenciosamente no meio dessa multidão louca ao seu redor - enlouquecendo-o, puxando-o de todos os lados. Você está ciente da ansiedade. Mas você não está ciente da angústia ainda. Em primeiro lugar, quando você sentir angústia, você sentirá em tremendo tormento, uma profunda depressão... - um abismo insondável se abrindo diante de você, e você caindo nele. É terrível no começo, mas somente no começo. Se você puder ser paciente, só um pouquinho paciente, e permitir o que quer que aconteça, logo, logo, você ficará ciente de uma nova qualidade em seu ser: tudo o que está acontecendo está ao seu redor, não está acontecendo em você. É algo externo, não interno. Até mesmo sua própria mente é algo do exterior. No centro mais recôndito, há somente uma coisa. Esta coisa é: o testemunhar, a observação, a atenção, a consciência. E é a isso que eu chamo de meditação. Sem a angústia você não pode meditar. Você tem de passar através do fogo da angústia. Ele queimará o lixo e o deixará mais limpo e rejuvenescido. E o seu ser não está muito distante. Ele está aí, muito perto, mas simplesmente o zumbido de todos os pensamentos não lhe permite ouvi-lo, vê-lo, senti-lo. A angústia é a indagação dentro da própria pessoa, pondo a interrogação nela mesma. Vocês têm perguntado coisas como "quem é Deus?" e "quem criou o mundo?". Todas essas perguntas são apenas para mentes retardadas. Uma mente madura tem somente uma questão. Nem mesmo duas, apenas uma única questão: "Quem sou eu?". E isso também você não tem de perguntar verbalmente, você tem apenas de estar no estado de questionamento. Você não tem de repetir "quem sou eu?", você tem apenas de estar presente, atento, olhando... não perguntando verbalmente, mas perguntando existencialmente. E essa questão existencial é terrível no começo, dolorosa no começo, mas traz todas as bênçãos no final. Gautama, O Buda, disse: "Meu caminho no começo é amargo, mas no fim é muito doce.". Que caminho? Ele não está falando sobre a religião budista - embora seja dessa forma que os monges budistas irão interpretar. Ele está falando sobre o caminho do qual eu estou falando - o caminho que o leva para dentro. Sim, ele é amargo no começo, mas doce no fim. Ele é como a morte no começo e é a vida eterna no fim. E todas as bênçãos da existência são suas. Você fica tão abençoado que pode abençoar toda a existência. Esse é o significado da palavra ‘Bhagwan’; O Abençoado O Abençoado nasce da angustia.